'Existe preconceito com treinadores do Nordeste', diz Arnaldo Lira

05/02/2012 11:43

Em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM/BA, o treinador falou sobre o Bahia de Feira, a passagem pelo Icasa e a possibilidade de ser bi do Baiano

Por Thiago Pereira Feira de Santana, BA

 
 

Para o técnico Arnaldo Lira, provocar surpresa já não é nenhuma novidade. Em 2011, com o Bahia de Feira, conquistou o título de campeão baiano em cima do Vitória em pleno Barradão. Este ano, novamente com a equipe feirense, tornou-se dono da melhor campanha no início do estadual, com quatro triunfos em quatro jogos disputados.

Nômade do futebol, Lira acumula passagens por equipes de várias regiões do Brasil, como Ferroviário, Paysandu, Ituano, ABC, Maranhão, Sampaio Corrêa, Moto Clube, Criciúma, CRB, ASA de Arapiraca e Treze de Campina Grande.

Técnico Arnaldo Lira à frente do Ferroviário em 2009 (Foto: LC Moreira/Agência Diário)Arnaldo Lira luta para conquistar o bicampeonato pelo Bahia de Feira (Foto: LC Moreira/Agência Diário)

Em entrevista concedida ao GLOBOESPORTE.COM/BA, o treinador falou sobre a expectativa de ser o primeiro treinador a levar um time do interior ao bicampeonato baiano e revelou como pretende armar o Bahia de Feira para a disputa simultânea do estadual e da Copa do Brasil. Lira também relembrou a passagem pelo Icasa no final do ano passado e afirmou que só não treinou uma equipe grande do futebol brasileiro porque existe preconceito com técnicos nordestinos. Confira abaixo:

O Bahia de Feira se tornou a sensação do Campeonato Baiano 2012 com quatro triunfos em quatro jogos. Qual o segredo para o desempenho 100% do time no estadual?
Acho que mesclou a experiência de alguns jogadores com outros que tem muito talento e que já estavam aqui, como é o caso do Paulo Paraíba, do Menezes, que eram jogadores que eu já conhecia. O Menezes por exemplo, atuou em 19 partidas pelo Bahia na Série B. Tem 22 anos de idade, mas já tinha feito dupla de zaga comigo no Ferroviário e trouxe ele para jogar com o Paulo Paraíba aqui. Eles já têm um certo entrosamento. Na frente, João Neto e Carlinhos já tinham sido campeões. A gente deu sorte na contratação do Carlos, um volante de 22 anos e 1,88m de altura. A gente deu uma acertada no time e mesclou com a experiência de Lau e Jackson. Na realidade, o time acabou encaixando nesse início de competição, mas o Campeonato Baiano é longo.
 

Arnaldo Lira, técnico do Bahia de Feira (Foto: Reprodução/TV Subaé)Treinador reclamou do preconceito contra técnico
do Nordeste (Foto: Reprodução/TV Subaé)

Por sinal, o Jackson ainda não entrou como titular. Algum problema com ele?
Ele já foi utilizado. O problema é que ele vinha de um longo período de inatividade e teve um problema de contusão no ABC. Chegou no Bahia de Feira e sentiu um pouco a contusão e, na verdade, ele ainda não pegou o ritmo de jogo. Está treinando forte, se esforçando. E na posição dele a gente tem o Raylan, que é a grande sensação do campeonato.

Raylan é apontado como muitos como um dos principais jogadores do Bahia de Feira nesse início de Campeonato Baiano. Você o considera a grande revelação da competição até aqui?
O Raylan é jovem, tem 21 anos de idade, veio de uma equipe de segunda divisão do futebol baiana, tem alguns defeitos, mas estamos trabalhando com ele. Tem muito talento. Acho que ele tem tudo para jogar em grandes clubes do futebol brasileiro.

Um clube do interior nunca conquistou o título baiano duas vezes seguidas. Acha que o Bahia de Feira pode acabar com esse tabu?
Não é só na Bahia não. Qual o time do interior que ganhou duas vezes um estadual? Eu não me recordo. Mas primeiro nós temos que nos classificar entre os quatro, para depois pensar em título. Acho que pelo início da competição, temos condições. Mas este é só o início. São 22 rodadas. Bahia e Vitória têm tudo para melhorar, já que ainda têm jogadores para estrear.

Qual o adversário mais perigoso do Campeonato Baiano 2012?
A gente não pode fugir de Bahia e Vitória. E este ano o Atlético de Alagoinhas também formou um elenco interessante. Eles têm jogadores experientes, como o Fausto, Garrinchinha, o Deon, o Rogério, que são jogadores acostumados a disputar o Campeonato Baiano. Acho que eles estão um pouquinho na frente.

O João Neto foi contratado pelo Bahia no ano passado, mas acabou não tendo muitas chances no Tricolor. Acha que ele foi mal aproveitado?
O João Neto jogou só uma partida. Não dá pra saber se um cara é bom se ele não joga. Tem que botar pra jogar pra ver. Mas time grande é assim mesmo, são muitas opções, o treinador tem que escolher uma, e acabou que ele não teve chances com o René Simões.

Apesar do título baiano do ano passado, o Bahia de Feira não conseguiu uma boa campanha na Série D do Campeonato Brasileiro. O que aconteceu?
As pessoas tem que entender o seguinte: O Bahia de Feira não tem estrutura para manter um elenco parado durante dois ou três meses até a disputa da Série D. Quando para, temos que emprestar os jogadores. Como é que o clube vai pagar R$5 mil ou R$6 mil para um jogador se não tem jogos durante dois ou três meses. Então tem que emprestar os jogadores e quando se chega na Série D tem que fazer todo o trabalho de montar um time novo para chegar bem. Isso até que se tenha uma equipe formada apenas por jogadores da casa para chegar forte na Série D e brigar para subir. Enquanto não ocorre, somos obrigados a vender dois ou três jogadores para capitalizar, já que uma Série D custa R$1 milhão. Pra mim seria ótimo manter o mesmo time que disputa o Baiano, mas quem é que vai pagar a conta?

Esse ano o Bahia de Feira disputa a Copa do Brasil simultaneamente com o Campeonato Baiano. Você pensa em poupar o time em alguma competição?
Não vamos poupar. Vamos ver que está em melhores condições e colocar pra jogar. Não vamos largar nenhuma competição. Vamos tentar passar de fase na Copa do Brasil enquanto disputamos o Campeonato Baiano.
 

técnico arnaldo lira recebe prêmio de melhor técnico do Campeonato Baiano (Foto: Eric Luis Carvalho/GloboEsporte.com)Arnaldo Lira foi premiado após o Baiano de 2011
(Foto: Eric Luis Carvalho/GloboEsporte.com)

Você foi contratado pelo Icasa em outubro do ano passado e demitido no mês seguinte. O que não deu certo no time cearense?
Eu fiz sete jogos. É só fazer as contas. Quem subiu teve aproveitamento de 50% (o Sport, 4º colocado em 2011, teve aproveitamento de 53%). Eu tive três vitórias, dois empates e duas derrotas. Isso dá 11 pontos em 21, mais de 50%. É pontuação pra subir, e não pra cair. Até eu chegar, o Icasa não havia vencido dois jogos seguidos. Comigo ele ganhou. Vencemos o Guarani em Campinas e o Salgueiro em Juazeiro. Além disso, empatamos com o Goiás em Goiânia. Tudo isso sem levar um gol. Mas aí eu não fiz o último jogo, contra a Portuguesa, que era a partida pra sair da zona de rebaixamento. Tive um problema com o presidente, ele queria colocar o Junior Xuxa no time, eu não queria. O presidente achou que podia ganhar da Portuguesa, que era a partida pra sair do rebaixamento. Acabou rebaixado.

Apesar do título baiano de 2011, seu nome não costuma ser especulado quando Bahia e Vitória precisam de um novo técnico. Sente mágoas dos times grandes da Bahia? Acha que existe um preconceito com os times do interior?
Eu acho que na verdade existe um preconceito com os treinadores do Nordeste. Se pegarmos a Série A e a Série B, veremos que não tem nenhum treinador nordestino, com raras exceções, como o Flávio Araújo, do América de Natal, e só porque subiu o time. Tem um amigo meu que fala que eu sou muito bom treinador, o problema é que sou do Nordeste. Só que eu não consigo entender, o presidente da República pode ser nordestino e comandar uma nação, e um treinador de futebol não pode ser do Nordeste. Você pode ter o sotaque carioca, paulista, gaúcho, agora o nordestino você não pode ter.

Acha que dá pra ser campeão baiano invicto?
Não. É difícil demais.